Resumo: |
A teoria do populismo erige-se como paradigma hegemônico de interpretação
do Estado Novo e da República de 1946 tendo como obras-síntese os clássicos estudos de Octávio
Ianni e Francisco Weffort, formulados após o golpe de 1964. Seguindo a hipótese de que sua
gênese deve ser buscada em disputas político-ideológicas no interior da esquerda que marcaram
o período de 1961-1964, o presente artigo argumenta que a obra de Fernando Henrique Cardoso
nesta conjuntura constitui um relevante, ainda que pouco estudado, ponto de ancoragem para
a devida compreensão da história da teoria do populismo. Bem compreendidos os fundamentos
marxistas desta obra, especificamente o modo como algumas noções desenvolvidas por Karl
Marx são apropriadas pelo autor de Empresário industrial e desenvolvimento econômico,
abre-se a possibilidade de inscrevê-lo na linhagem dos teóricos do populismo a partir de suas
concepções críticas sobre a democracia como entorpecimento, a passividade das massas, a
inconsciência de classe e o colapso necessário do sistema de conciliações do governo de
João Goulart. Ao retomar a inscrição política conjuntural da gênese de tal linhagem, trata-se
de empreender um movimento analítico de suspeição com relação à propalada neutralidade
axiológica da teoria do populismo - suspeição cujas implicações extrapolam o restrito âmbito
dos debates sobre a história dos conceitos, alcançando também um momento histórico em que, após décadas de elaborações críticas sobre os limites daquela teoria, é notável uma tendência
de retomada de seus controversos fundamentos teórico-políticos em diversas e influentes análises
sobre o período de 2003-2016.
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